A escritora Maria Velho da Costa faleceu este sábado, aos 81 anos. Com obra publicada em vários géneros literários, foi galardoada com o Prémio Camões em 2002. Em 1972, assinou, com Maria Teresa Horta e Maria Isabel Barreno, “Novas Cartas Portuguesas”, obra que, pela defesa da condição feminina e pela denúncia do Estado Novo, foi banida pelo regime por “atentado à moral pública e aos bons costumes” e levou as autoras a tribunal. Antes, já Maria Velho da Costa tinha publicado “Maina Mendes” (1969), mas foi com “Madame” (2000) e “Casas Pardas” (1977) que a sua história e a do Teatro Nacional São João se cruzaram.
A 23 de Março de 2000 o palco do São João estreava “Madame”, a peça que Velho da Costa criou sobre “Os Maias”, de Eça de Queirós, e “Dom Casmurro”, de Machado de Assis, encenada por Ricardo Pais. Essa ponte transatlântica entre duas obras maiores da Literatura Portuguesa – um “surpreendente vaudeville” criado por “um espírito ‘genialento’”, no dizer do encenador – estreou no ano em que se celebravam os 500 anos da viagem de Pedro Álvares Cabral, o que motivou uma digressão pelo Brasil. O livro “Madame” foi reeditado há poucos meses e integra a Coleção Teatro Nacional São João nas Edições Húmus.
“Casas Pardas” chegou ao São João a 6 de dezembro de 2012, pela mão de Nuno Carinhas. Nessa obra, escrita no período pós-revolucionário, a autora abordava “a necessidade de repensarmos a maneira como iríamos construir dentro de portas este país, de como iríamos usar esta tão jovem democracia nessa construção”, dizia então Nuno Carinhas no Manual de Leitura do espetáculo. Luísa Costa Gomes, responsável pela adaptação de “Casas Pardas”, classificava Maria Velho da Costa como “a grande cultora, não só da língua, mas de uma atitude artística de seriedade e exigência que trazemos descurada nestes tempos industriais.”
No mesmo Manual de Leitura, o São João republicava o seu “Manifesto de escritor em linguagem fácil para uma campanha difícil” de 1973, no qual afirmava: “Não existe entre o escritor português e o de qualquer outra parte do mundo qualquer diferença fundamental quanto à sua função: ver e contar. Por escrito. Nem qualquer outra obrigação lhe assiste por definição estrita do cargo senão essa – alinhar palavras por forma a que lhe façam sentido. E aos outros. E é nesses dois eixos – o da busca de sentido e o do reconhecimento dela como válida pelos outros – que se começa a poder apertar a gosto o gargalo esganado dos dois termos: escritor e português. Aqui e agora.”